“Antes de dar palpites furados na economia, o ex-ministro da Fazenda poderia ocupar seu tempo para talvez escrever uma autobiografia, a fim de explicar as trapalhadas por ele produzidas que tantos prejuízos causaram à economia do Brasil”, sugere líder do PDT na Câmara, André Figueiredo em artigo publicado no site Congresso em Foco. Veja a íntegra.
Em entrevista à jornalista Eliane Catanhêde, no último sábado, o veterano economista Delfim Netto praticou um de seus passatempos preferidos, ou seja, dar palpites na economia. Ao contrário do que fez nos últimos anos – em que reiteradamente laureou a política econômica conduzida pelos ministros Palocci e Mantega -, desta vez deu seu ar da graça para aderir ao discurso da crise fiscal e apontar o dedo para o governo e suas supostas falhas na economia nos últimos anos. Em 2011, Delfim Netto dizia ser Dilma “uma evolução em relação a Lula, em todos os quesitos, não só econômicos.” Segundo ele, Dilma merecia uma nota 9,9.
Pois bem. Não é que agora, o Dr. Delfim Netto muda de ideia e entre outras críticas diz que Dilma é uma trapalhona? Que Dilma não está à altura de Lula, um político pragmático e de inteligência extraordinária. Foi mais longe e disse que o defeito de Dilma viria de sua origem na esquerda brizolista. Atacou Leonel Brizola, referindo-se a ele como o velho engenheiro problemático, “que por onde passou destruiu tudo, destruiu de tal jeito o Rio Grande do Sul que ninguém mais salva.”
Inacreditavelmente, Delfim Netto atribui os atuais problemas econômicos do Rio Grande do Sul a Leonel Brizola, que deixou o governo gaúcho há 53 anos. De lá para cá, o RS foi governado pela esquerda por no máximo 12 anos, e por mais de 40 anos foi submetido a políticas liberais e privatizantes da direita. Mas, mesmo assim, Delfim atribui a Brizola os problemas daquele estado.
Ele, na verdade, segue o velho discurso da direita e dos militares, que, durante o regime de exceção, impingiram uma forte carga de negativismo em cima do legado de Getúlio, Jango e Brizola. Com a redemocratização, esta estratégia não foi abandonada. Brizola sempre foi hostilizado e suas políticas governamentais receberam o menosprezo das elites políticas brasileiras. Alvo de críticas e perseguições de seus adversários e da mídia, o ensino integral foi uma das maiores bandeiras do ex-governador do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro, que resultou na criação dos Cieps nos anos 1980, idealizados pelo educador Darcy Ribeiro. Foi durante seus dois mandatos como governador do Rio de Janeiro (1983 a 1987 e 1991 a 1994) que mais de 500 Cieps foram construídos e postos em funcionamento no estado.
Mas tudo começou muito antes. Como prefeito de Porto Alegre, eleito em 1955, que estreitou sua relação com a educação ao promover a criação de colégios de turnos tradicionais na capital gaúcha, prática que continuou em nível estadual, quando se tornou governador em 1958. Com o lema “Nenhuma criança sem escola no RS”, foram construídas cerca de 5,9 mil escolas primárias sob sua regência.
Outra importante marca de Leonel Brizola, reconhecida por todos, foi sua disciplina orçamentária, um gestor arguto que sempre manteve as finanças nos eixos com arrecadação eficiente e priorizando o investimento social. Ao terminar cada um dos mandatos de governador, Brizola sempre se orgulhou de não deixar endividamentos como herança.
Por outro lado, não se pode dizer o mesmo da trajetória do ex-ministro Delfim Netto. Uma das críticas que ele recebe até hoje é a de ter sido o responsável pela mais forte concentração de renda da história do Brasil, durante os governos militares de Costa e Silva, Médici e Figueiredo. Ficou famosa sua frase de que seria preciso esperar o bolo crescer para, depois, reparti-lo. Mas o bolo cresceu e nunca foi dividido. Além de conceder incentivos às exportações e ao investimento estrangeiro no país, a política de Delfim era caracterizada pelo congelamento dos salários e a elevação das tarifas públicas. O economista também é tido como um dos principais responsáveis pelo endividamento externo do país.
Em 1978, foi acusado de falsificar os índices de inflação de 1973 – de 24,8% para 14% – pela Comissão Parlamentar de Inquérito que investigava a política salarial. Se o Plano Real, que acabou com a inflação, tem vários pais, não se pode dizer o mesmo dos longos períodos de inflação alta no Brasil. O pai da hiperinflação é Delfim Netto.
Mais recentemente, ao lamentar alguns efeitos da distribuição de renda e da ascensão social no Brasil, Delfim Netto comparou a empregada doméstica a um bicho de carga. “Quem teve este animal, teve; quem não teve nunca mais vai ter”, afirmou durante entrevista ao Canal Livre, da Band.
Entendo que antes de dar palpites furados na economia, o ex-ministro Delfim Netto poderia ocupar seu tempo para talvez escrever uma autobiografia, a fim de explicar as trapalhadas por ele produzidas que tantos prejuízos causaram à economia do Brasil. E como título, sugiro uma espécie de mea-culpa que ele fez sobre sua passagem pelo Poder Executivo. Disse Delfim, ao jornal Folha de S.Paulo, de 5 de abril de 2014: “O descaso com a educação foi nosso erro mortal (no regime militar).”
*É deputado pelo Ceará e líder do PDT na Câmara.