Apesar do relatório (substitutivo) apresentado pelo deputado Samuel Moreira (PSDB – SP) à PEC 6/19 ter alterado significativamente a proposta inicial do Governo, o texto manteve pontos graves e até piorou ainda mais a situação dos trabalhadores mais pobres. Podemos destacar, dentre esses pontos: a desconstitucionalização de direitos; mudanças nas regras de cálculo; pensão por morte; aposentadoria dos professores; mudanças no Abono Salarial; aposentadoria especial.
O ônus dos problemas do sistema previdenciário e da crise econômica continua sendo pago pela população mais carente e pelos trabalhadores do Regime Geral de Previdência Social (INSS) que terão de trabalhar mais tempo para receber uma aposentadoria menor. O discurso do governo de que essa Reforma da Previdência vai acabar com privilégios e diminuir o desemprego é falso, porque o que vai acontecer, de fato, é o empobrecimento da população brasileira.
Está claro que a proposta do governo é de fazer economia às custas, especialmente, do trabalhador do INSS, que já sofre com os baixos salários e terá, no futuro, grandes perdas na aposentadoria. Mas o que não se pode esquecer é que salários e proventos reduzidos também diminuem o consumo, o que é péssimo para a economia.
Sabemos da importância de se discutir a Previdência, e o PDT não se furtará a isso. No entanto, o substitutivo, assim como o projeto inicial do Governo, não nos dá outra opção a não ser a de rejeitar, em razão de pontos que consideramos gravíssimos. Entre eles, o que poderá ser um crime contra a nossa Constituição Federal e contra o sistema previdenciário brasileiro: a desconstitucionalização, que permitirá a sua regulamentação por lei ordinária, mediante ritos bem mais simples de aprovação no Congresso, gerando, com isso, um permanente clima de insegurança para as gerações futuras.
O PDT não é contra debater um novo modelo de Previdência, mas queremos discutir um sistema que tenha equilíbrio, não retire direitos do trabalhador nem o submeta a aposentadorias humilhantes. Não podemos permitir que a desigualdade social se aprofunde ainda mais. Não podemos retroceder e nem enterrar, literalmente, conquistas importantes para o trabalhador. Precisamos definir modelos que impossibilitem desonerações descabidas, combatam as fraudes e criem novas fontes de arrecadação em determinados setores. É o futuro de milhões de brasileiros que está em jogo.
A previdência social deve ter um caráter de proteção, em especial, aos idosos que trabalharam a maior parte da vida e, no momento em que mais precisam ter garantido um benefício digno para se manterem fora do mercado de trabalho, correm o risco, com essa proposta, de viverem em situação de miserabilidade.
Para facilitar o entendimento, preparamos exemplos, com as regras propostas e situações reais de trabalhadores, que mostram, de forma clara, o que o Governo não contou sobre Reforma da Previdência.
COM A REFORMA DA PREVIDÊNCIA, VOCÊ TRABALHADOR QUE CONTRIBUI PARA O INSS IRÁ TRABALHAR MAIS E GANHAR MENOS
Ao contrário do que muitos afirmam, a reforma da previdência proposta no substitutivo da PEC 6/19 vai prejudicar absolutamente todos os trabalhadores que contribuem para o INSS. Como dito anteriormente, o texto estabelece regras que reduzirão muito o valor das futuras aposentadorias e pensões
Base de Cálculo
A mudança no critério de definição da base de cálculo dos benefícios mudou para pior, porque passa a utilizar nos cálculos todos os salários do segurado, inclusive os menores. Hoje, as remunerações mais baixas (20% menores) não são levadas em consideração. Ao considerar todos os salários, inclusive os menores, os benefícios do INSS perdem cerca de 15% de seu valor.
Vejamos o exemplo de Senhor João. Ele sempre progrediu profissionalmente. No início, seu salário era de R$ 1.000,00 por mês e, ao final de seu período laboral, recebia R$ 5.000 mensal[1]. Senhor João contribuiu por 35 anos. Se ele se aposentasse hoje, sua média remuneratória seria de R$ 3.500,00, afinal, seus primeiros salários, os mais baixos, não foram utilizados nesse cálculo. Mas pela proposta do Governo, todos os seus salários são considerados, o que fará sua média salarial cair. No caso de Senhor João, esse valor será de R$ 3.000,00 (-15%). Ele irá perder R$ 500,00 de uma vez.
Esses valores citados representam o máximo que o Senhor João poderá receber de aposentadoria. Mas o valor do benefício não será necessariamente a sua média salarial, porque outro fator que entra no cálculo é o tempo de contribuição.
Tempo de contribuição
Atualmente, um trabalhador pode se aposentar com a média das maiores contribuições se contribuir por 35 (homem) ou 30 anos (mulher). Em nosso exemplo, Senhor João terá direito à aposentadoria de R$ 3.500,00 por mês, ao contribuir por 35 anos.
Mas, depois da Reforma, se trabalhar por 35 anos, o Senhor João ainda não terá direito a receber a média dos salários. Com a provação da PEC, só receberá esse valor integralmente se trabalhar por 40 anos, 5 anos a mais do que hoje.
Com o novo tempo de contribuição, com 35 anos de carteira assinadas terá direito a apenas 90% da média de todos os salários (R$ 3.000,00 por mês, como calculados acima). Senhor João terá direito a uma aposentadoria de R$ 2.700,00 mensal, R$ 800,00 a menos do que receberia pelas regras atuais. Então, resumindo o caso de Seu João:
Mulheres
Mas nada pode ser tão ruim, que não possa piorar ainda mais. Se o Senhor João fosse mulher, seria muito pior. Para ilustrar, vamos trazer o caso da Dona Maria, que também teve a mesma progressão salarial do Senhor João. Nos primeiros anos de trabalho recebia salário de R$ 1.000,00 por mês e, ao final de sua atividade laboral, depois de 30 anos de contribuição, recebe R$ 5.000,00 por mês. Em relação ao cálculo da média (o primeiro cálculo feito acima), os valores para a Dona Maria são absolutamente os mesmos de João. No atual regime, sua média é de R$ 3.500,00, no modelo novo, R$ 3.000,00. Até aí tudo bem, mas daqui para a frente a situação de Dona Maria piora, e muito.
Pelas regras atuais, Maria poderá se aposentar com o valor cheio da média (valor acima), se contribuiu por 30 anos. Com a nova regra, Dona Maria terá direito a apenas 80% daquele valor (de R$ 3.000,00), ou seja, R$ 2.400,00 por mês de aposentadoria, ou 31,4% a menos do que receberia hoje. Para ter direito a R$ 3.000,00 terá que contribuir, necessariamente, por 40 anos, 10 a mais.
Resumindo a situação de Dona Maria no atual regramento e no futuro temos:
Professoras
Um alerta às professoras do ensino fundamental: a sua situação é ainda mais grave. Hoje, uma professora pode aposentar-se ao completar 25 anos de contribuição. Preenchido esse requisito, poderá ter direito ao valor “cheio” da média de seus salários. Com o novo regramento, os 25 anos de contribuição de uma professora dá direito a apenas 70% da média salarial. Comparado ao atual regramento, há uma redução do salário de mais de 40%. Se ela contribuir por mais 15 anos, totalizando 40 anos de contribuição, terá direito a R$ 3.000,00 por mês.
Pensão
Se o cálculo do valor das aposentadorias já achata os benefícios, a situação fica ainda mais lamentável quando se trata das novas regras de pensão.
A pensão por morte é um benefício previdenciário pago mensalmente aos dependentes do trabalhador. Hoje, a(o) viúva(o) e demais dependentes têm direito a 100% do valor da aposentadoria, repartido entre eles. Quando um dos dependentes perde essa qualidade, por exemplo, quando completa 21 anos, o valor é revertido para os demais dependentes.
Pela proposta, será instituída uma cota familiar correspondente a 50% do valor da aposentadoria, com um acréscimo de 10% por dependente. Então, apenas a título de exemplo, se o falecido deixa como dependentes sua esposa e filho menor, estes terão direito a 70% do valor da aposentadoria, e não mais a 100% como é hoje. Quando o filho completar 21 anos, o valor da pensão será reduzido em 10%, pois, como foi dito, a “cota individual” não se reverte em benefício dos demais dependentes.
Para ilustrar, se o Senhor José falecer antes da entrada em vigor da PEC 6/19, seus dependentes terão direito a R$ 3.500,00 por mês de pensão. Mas, se o Senhor José falecer depois da aprovação da PEC 6/19, considerando que ele contribuiu por 35 anos e que deixa cônjuge e um filho menor, seus dependentes terão direito a R$ 1.890,00 mensais. Quando o filho do Senhor José atingir 21 anos, a pensão de sua esposa terá uma redução de R$ 270,00 por mês – sua pensão será de R$ 1.620,00/mês. Fica visível a queda na renda da viúva se compararmos com o valor que recebia de pensão pelo atual sistema de previdência, que é de R$ 3.500,00/mês.
Os exemplos de cálculo de pensão acima levaram em consideração os deságios de aposentadoria de trabalhador (que não é professor) do sexo masculino. Se for levado em consideração a aposentadoria de mulher ou de professor(a), a situação é ainda mais crítica.
Pensão
Por incrível que pareça, tudo pode ficar ainda pior. E isso acontece porque a PEC 6/19 propõe redução do valor da pensão ou aposentadoria quando acumuladas por um mesmo beneficiário. Hoje, não existe essa regra. Uma pessoa pode receber integralmente o valor de sua aposentadoria e a pensão de seu cônjuge. Mas de acordo com a proposta de reforma, a pessoa que acumula esses dois benefícios terá direito ao recebimento integral do maior benefício e apenas uma parcela do outro, que poderá ser até 63% menor. Para facilitar, vejamos um exemplo: Senhor José, do primeiro exemplo, é casado com a Dona Patrícia, que também trabalhou sua vida inteira. Consideremos que ambos se aposentaram depois da PEC 6/19 com o mesmo salário: R$ 3.000,00. Infelizmente, Senhor José falece, deixando como dependentes Dona Patrícia e um filho menor. Fazendo o deságio acima apontado (para o cálculo de pensão), Dona Maria teria direito à pensão de R$ 1.890,00 (se fosse sua única fonte). Como ela recebe aposentadoria, e como esta é maior, Dona Patrícia receberá integralmente R$ 3.000,00 da sua aposentadoria, mas em relação à pensão deixada por seu marido, a PEC 6/19 impõe uma redução gradativa. Feitos os cálculos, Dona Patrícia terá direito à pensão por morte do seu marido correspondente a R$ 1.334,00. Com isso, a renda familiar de R$ 6.000,00 mensais foi reduzida para R$ 4.334,00 por mês com a morte do Senhor José, uma redução aproximada de 28%.
Se o Senhor José e a Dona Patrícia tivessem se aposentado antes da PEC 6/19, e o Senhor José tivesse falecido também antes, Dona Patrícia teria direito a aposentadoria de R$ 3.500,00/mês mais R$ 3.500,00 de pensão, totalizando R$ 7.000,00/mês.
Se comparadas as rendas familiares nesses dois sistemas, esta, conforme a PEC 6/19, seria reduzida em aproximadamente 39,0%.
As regras explicadas e exemplificadas acima aplicam-se a absolutamente todos os segurados e beneficiários do INSS. Nitidamente, o trabalhador e sua família vão sofrer redução significativa da renda, seja por conta dos novos critérios de apuração de aposentadoria, seja em função das regras de definição de valor de pensão e de acúmulo de benefícios.
Ascom e com Assessoria Técnica Lid/PDT