Artigo: “O Brasil ficou refém do Rio de Janeiro”

Artigo: “O Brasil ficou refém do Rio de Janeiro”

Três dias após o presidente Michel Temer decretar a intervenção federal na Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro, qualquer um que arriscar a antecipar resultados, estará, na prática, registrando a sua cartela de apostas. E nas probabilidades de erros e acertos alguns acertarão, até porque estas não são tão variadas.

Com cautela, não arriscarei palpites quanto aos resultados. Torço para que sejam 100% exitosos em relação aos objetivos estabelecidos. Principalmente os objetivos técnicos, que são: combater a criminalidade; estancar a violência; garantir a paz para a população do Rio de Janeiro e, quiçá, com reflexos positivos na população dos demais estados.

Os objetivos políticos, estes são inconfessáveis, mas não indevassáveis.

Viabilizar a Reforma da Previdência no final do ano; perseguir uma agenda política que torne o presidente ator importante nas eleições; e criar mecanismos jurídicos para atender financeiramente o Rio de Janeiro são algumas das teses a povoar nosso imaginário.

Vejo uma grande limitação desta proposta, uma vez que a capacidade de investigação continuará limitada, já que é restrita aos delegados. E no Rio de Janeiro 96% dos inquéritos instaurados para apurar homicídios são arquivados sem definir a autoria e a materialidade.

Não vejo como o Decreto de Intervenção possa superar esse obstáculo absurdo. Ou as informações da inteligência das Forças Armadas servirão também para sustentar o indiciamento? Tomara que sim. Será um bom precedente.

É importante ressaltar que até aqui, a intervenção não aponta para a valorização das Polícias e dos Policiais. Não sinaliza nenhum legado de valorização e fortalecimento da classe. Mas o caos da segurança no Rio de Janeiro e em todo o Brasil é uma tragédia anunciada. Afinal, apesar dos apelos, diagnósticos e crises, o Brasil vive há trinta anos sem uma Política Nacional e de Estado voltada para a segurança pública.

Encontramos origem já na Constituinte, que tratou de maneira desorganizada este direito social básico do cidadão.  Isto porque, ao definir que a responsabilidade pela segurança pública é exclusiva do Estado sem concorrer com a iniciativa privada, não previu uma coordenação nacional. Muito menos garantiu os recursos mínimos necessários, como o fez com a saúde e educação – também direitos fundamentais – para as quais foram estabelecidos instrumentos de articulação e integração nacional. Para a Saúde e Educação, também ficou constitucionalmente estabelecida a responsabilidade dos entes federados quanto à execução mínima do orçamento. Para a segurança pública, no entanto, nada foi feito nesse sentido.

Uma das consequências desta desorganização é que o Governo Federal nunca conseguiu sequer apresentar um Plano Nacional de Segurança Pública, prevalecendo uma significativa criminalização da ação dos Policiais, em especial dos Policiais Militares, no combate à criminalidade.

Fernando Henrique tentou fazê-lo no final de seu governo; a Câmara também fez várias tentativas; o Lula apresentou o PRONASCI (que morreu quando acabou o orçamento estabelecido); a Dilma foi incapaz de apresentar sequer um Plano de Redução de Homicídios; e o Temer não conseguiu elaborar um plano até agora. Suas ações concretas passam pela decretação da GLO em vários momentos. E agora, a intervenção.

Ao decretar a intervenção no Rio de Janeiro, o Governo Temer faz uma opção arriscada e até irresponsável com o restante dos Estados Brasileiros. Algumas medidas fundamentais para melhorar a segurança pública passam necessariamente pela alteração da Constituição.

Subtenente Gonzaga é deputado pelo PDT de Minas Gerais